Abençoada herança!
Sempre vivi em Casal de Cambra. Foi o bairro que os meus pais escolheram há mais de 40 anos porque encontraram aí uma vivenda jeitosa e com terreno gigante que lhes permite até hoje ter criação e cultivo para auto sustento. Foi durante muitos anos o "maior bairro clandestino da Europa" porque havia espaço por onde crescer e muita gente trabalhadora, cheia de sonhos e muita vontade de os concretizar, ansiosos por constituir família mas proporcionar-lhe outros confortos, os que lhes foram negados enquanto crianças nas aldeias do Interior, do Alentejo, do Norte e de muitos pontos do país longe da capital e das possibilidades que só aqui existiam. Casal de Cambra foi crescendo fruto de trabalho árduo, a pulso, com calos nas mãos que vinham da agricultura "urbana" e das casas que construíram aos poucos, à medida das possibilidades e do tempo que sobrava dos empregos que lhes garantia o sustento fixo. Foi assim que nasceram os alicerces do que hoje chamo casa.
Recordo uma infância com brincadeiras na rua, a brincar às lojas com caixas da fruta e folhas das árvores a fazer de notas, de bolos feitos com terra molhada, de jogos da macaca e do mata pela noite fora, desenhados no chão da rua onde praticamente não passavam carros. Sempre tivemos galinhas, coelhos, cabras, ovelhas e no inverno porcos para matança por esta altura do ano, antes da chegada do calor (para evitar o mau cheiro) e a todos, (leia-se, a uns mais do que a outros...), era dada a tarefa de os alimentar ou pelo menos ajudar seja com o apanhar das folhas velhas de couve, carregar os cestos de erva, separar e cortar a fruta tocada ou fazer as misturas do milho com os farelos que adorávamos mexer com as mãos.
Tivemos uma infância simples, sem luxos, mas privilegiada tanto no contacto com a natureza como no estilo de vida saudável, seja pelo tipo de brincadeiras, seja pela alimentação que nos foi proporcionada com base em produtos frescos, naturais, variando em função da oferta da época do ano. Ajudámos a semear e a apanhar batatas; foram muitas as apanhas de azeitona no pico do inverno nas férias do Natal; descascámos feijão, pisámos e escolhemos grão; subimos às árvores para apanhar cerejas, figos, maçãs; amassámos pão e filhós para depois ajudar a pôr no forno ou a virar na frigideira; lavámos tripas e enchemos chouriços de todas as qualidades e feitios. Fizemos isto tudo e sobrevivemos. Não deixámos de ser crianças porque ajudávamos nas tarefas dos adultos, pelo contrário! Isso ajudou-nos a crescer a saber fazer um pouco de tudo, a não ter medo de sujar as mãos, a assumir responsabilidades e a cumprir tarefas.
Fazer isto com os nossos filhos parece missão impossível nos tempos de hoje, em que tudo parece ser "perigoso ou arriscado", não vá a menina cortar-se ou cair da árvore! E assim se criam crianças, minhas filhas incluídas, super protegidas a quem se nega uma infância aparentemente simples de mais. O importante parecem ser as idas ao teatro, cinema e workshops, saídas e viagens para conhecerem o mundo, quando na verdade as estamos simplesmente a afastar das suas raízes, da ligação à terra e do que dela provém, do tanto que há para aprender e saber fazer com as mãos livres, longe da televisão e do tablet. Hoje, mais do que nunca, percebo o quanto as vivências e aprendizagens da minha infância e adolescência me ajudaram na minha formação, no meu espírito de inter-ajuda e na capacidade de saber, ou pelo menos tentar fazer, um pouco de tudo. Já dizia a minha avó: o saber não ocupa lugar! E não podia estar mais certa. Urgente é saber valorizar, ter vontade de aprender e arriscar sujar as mãos.
Recordo uma infância com brincadeiras na rua, a brincar às lojas com caixas da fruta e folhas das árvores a fazer de notas, de bolos feitos com terra molhada, de jogos da macaca e do mata pela noite fora, desenhados no chão da rua onde praticamente não passavam carros. Sempre tivemos galinhas, coelhos, cabras, ovelhas e no inverno porcos para matança por esta altura do ano, antes da chegada do calor (para evitar o mau cheiro) e a todos, (leia-se, a uns mais do que a outros...), era dada a tarefa de os alimentar ou pelo menos ajudar seja com o apanhar das folhas velhas de couve, carregar os cestos de erva, separar e cortar a fruta tocada ou fazer as misturas do milho com os farelos que adorávamos mexer com as mãos.
Tivemos uma infância simples, sem luxos, mas privilegiada tanto no contacto com a natureza como no estilo de vida saudável, seja pelo tipo de brincadeiras, seja pela alimentação que nos foi proporcionada com base em produtos frescos, naturais, variando em função da oferta da época do ano. Ajudámos a semear e a apanhar batatas; foram muitas as apanhas de azeitona no pico do inverno nas férias do Natal; descascámos feijão, pisámos e escolhemos grão; subimos às árvores para apanhar cerejas, figos, maçãs; amassámos pão e filhós para depois ajudar a pôr no forno ou a virar na frigideira; lavámos tripas e enchemos chouriços de todas as qualidades e feitios. Fizemos isto tudo e sobrevivemos. Não deixámos de ser crianças porque ajudávamos nas tarefas dos adultos, pelo contrário! Isso ajudou-nos a crescer a saber fazer um pouco de tudo, a não ter medo de sujar as mãos, a assumir responsabilidades e a cumprir tarefas.
Fazer isto com os nossos filhos parece missão impossível nos tempos de hoje, em que tudo parece ser "perigoso ou arriscado", não vá a menina cortar-se ou cair da árvore! E assim se criam crianças, minhas filhas incluídas, super protegidas a quem se nega uma infância aparentemente simples de mais. O importante parecem ser as idas ao teatro, cinema e workshops, saídas e viagens para conhecerem o mundo, quando na verdade as estamos simplesmente a afastar das suas raízes, da ligação à terra e do que dela provém, do tanto que há para aprender e saber fazer com as mãos livres, longe da televisão e do tablet. Hoje, mais do que nunca, percebo o quanto as vivências e aprendizagens da minha infância e adolescência me ajudaram na minha formação, no meu espírito de inter-ajuda e na capacidade de saber, ou pelo menos tentar fazer, um pouco de tudo. Já dizia a minha avó: o saber não ocupa lugar! E não podia estar mais certa. Urgente é saber valorizar, ter vontade de aprender e arriscar sujar as mãos.
Isto tudo para dizer que me orgulho da infância que tive, do bairro (agora vila) onde sempre vivi, de tudo o que consegui aprender e fazer graças à passagem de testemunho de geração em geração. Do quanto me impressiona a capacidade que os meus pais tiveram para começar a vida do zero e terem conseguido tudo o que têm unicamente fruto do seu trabalho. Foram anos de esforço, dedicação, sacrifício mas que felizmente lhes continua a dar frutos. Ainda hoje continuam a semear para depois colher, a criar para depois comer e dar de comer. Com uma capacidade excepcional de trabalho, sobretudo da minha mãe que coze pão ao mesmo tempo que faz o almoço para os 15 lá de casa; faz massa de filhós em dose industrial para ter sempre o que oferecer; que faz enchidos a contar com a casa das filhas mais a oferta ao vizinho e aos tios e às amigas. De uma força de trabalho e generosidade em vias de extinção... Obrigada por terem escolhido Casal de Cambra para viver, perto da capital onde estudámos e trabalhamos, mas longe o suficiente para ter condições de manter hábitos e tradições de uma vida no campo. Abençoada herança!
Este fim de semana foi a da matança do porco,
com direito a fritada como recompensa aos ajudantes ;)
Nota: na foto só aparece o marido mas foi pura coincidência porque para estas lides a família é toda convocada 😅💪🏻
Comentários
Parabéns e obrigada